domingo, 15 de maio de 2011

1. Biografia de JK

Juscelino Kubitschek de Oliveira nasceu em 12 de setembro de 1902 no município de Diamantina, há 294 quilômetros de Belo Horizonte, estado de Minas Gerais. Em 1921 mudou-se para a capital, onde se graduou em medicina em 1927. Em 1931, casou-se com Sarah Gomes de Lemos. Na revolução constitucionalista de 1932, serviu as tropas mineiras, como médico, no combate aos paulistas.

O pai, João César de Oliveira foi caixeiro viajante e exerceu outras profissões. A mãe, por sua vez, era professora e tinha ascendência checa e cigana. Gostava de futebol e torcia pelo América Mineiro, onde chegou a jogar no time amador. Destacou-se pela oratória, com discursos de frases marcantes, escritos pelo poeta Augusto Frederico Schimidt.

2. O Ingresso na Política

A carreira política iniciou em 1934, quando foi nomeado chefe da Casa Civil do interventor de Minas Gerais Benedito Valadares. Foi eleito deputado estadual no mesmo ano pelo recém criado “Partido Progressista”, onde permaneceu até o fechamento do congresso, realizado por Getúlio Vargas no golpe de estado.

Voltou ao exército, onde chegou ao posto de Tenente Coronel-Médico. Foi ainda prefeito de Belo Horizonte entre 1940 e 1945 e deputado federal constituinte pelo PSD. Entre 1951 e 1955 governou Minas Gerais.

2.1. A Chegada ao Planalto

O suicídio de Getúlio Vargas, em 24 de Agosto de 1954 abriu uma lacuna no poder e também na herança política, perseguida pelos seus sucessores e adversários. Para tal, foi lançada uma candidatura dita como “união nacional”, com a adesão de dois grandes partidos do Brasil na época, o PSD (Partido Social Democrático) e a UDN (União Democrática Nacional).

Cabe aqui fazer um ressalto para o uso de palavras derivadas de “democracia” na época em que ainda existiam fantasmas da ditadura de Getúlio Vargas nos anos 30 e 40, após o golpe de estado. O sentimento de um governo “democrático” emergia em boa parte da população. Hoje, esse sentimento está transformado em uma tendência “centro-esquerdista” de assistencialismo a população, após os resultados de programas implantados pelo presidente Lula.

Voltando a época “pós-Vargas”, os dois partidos teriam um candidato único que uniria a direita e o centro e evitaria uma nova ditadura radical como a Getulhista. Entretanto, essa ideia não prosperou e em fevereiro de 1955, o PSD lançou o nome de Juscelino como candidato à presidência da república. Entretanto, JK sabia que precisava do apoio de uma base mais solidificada, com aceitação popular. Foi então que o nome de João Goulart surgiu como vice. Este havia se lançado na “pré-campanha” como candidato a presidente pelo PTB e os dois partidos selaram a união poucos dias antes da homologação oficial das candidaturas.

A candidatura JK-Jango sofreu com muitas tentativas de inviabilizar a candidatura, por parte de partidos como o Partido Comunista Brasileiro. Mas o principal rival era a UDN, com tentativas escancaradas de inviabilizar a candidatura inclusive com meios ilícitos.

Uma das tentativas lícitas de impedir que os dois candidatos chegassem ao poder foi a proposição pela UDN de uma emenda constitucional, a qual transferia para a Câmara dos Deputados a eleição presidencial, no caso de o eleito não conseguir a maioria absoluta dos votos, ou seja, 50% mais um eleitor. Entretanto, essa medida não foi aprovada no congresso.

A eleição foi uma das mais disputadas até então e em três de outubro de 1955, Juscelino elegeu-se com 36% dos votos válidos, contra 30% de Juarez Távora, da UDN; 26% de Ademar de Barros do PSP e 8% de Plínio Salgado do PRP. Na época, os eleitores votavam também para vice-presidente e, mesmo assim, a chapa prosperou, pois Jango recebeu mais votos que JK.

A vitória foi uma das mais apertadas, com menor percentual de votos válidos. Após a eleição, os oposicionistas ainda realizaram uma sucessão de ameaças a legalidade democrática, cujo ponto crítico foi o Movimento 11 de Novembro, que ocorreu dois meses e meio antes da posse dos novos eleitos.

3. O Plano de Metas

O governo de Juscelino Kubitchek é lembrado como de grande desenvolvimento, incentivador do progresso econômico por meio da industrialização, com o compromisso de avançar 50 anos em cinco. Ao final do mandato, houve crise econômica e o país acabou endividado. Após a posse, o período foi de calmaria política, marcado apenas pelas contestações às tendências esquerdistas do presidente. Revoltas pontuais contavam sempre com um pequeno número de manifestantes e eram reprimidas pelas forças armadas.

O período de JK foi marcado por grandes obras e mudanças, muitas delas financiadas com o capital externo. São elas:

·         Criação do Conselho Nacional de Energia Nuclear;
·         Expansão das usinas hidrelétricas, com a construção da Usina de Paulo Afonso e aumento nas barragens de Furnas e Três Marias;
·         Criação do Grupo Executivo da Indústria de Construção Naval (Geicon);
·         Abertura de novas rodovias, como a Belém-Brasília, que uniu regiões isoladas entre si;
·         Criação do Ministério de Minas e Energia, para expansão da indústria do aço;
·         Criação da Superintendência para Desenvolvimento do Nordeste (Sudene);
·         Fundação de Brasília
·         Criação do Grupo Executivo da Indústria Automobilística
·         O Plano  de Metas, com 31 objetivos para serem cumpridos durante o mandato.

O Plano de Metas foi elaborado sob a orientação de Lucas Lopes e de Roberto Campos, por meio do trabalho conjunto do BNDE e do Conselho Nacional de Desenvolvimento, criado no dia seguinte à posse de JK. O grupo se voltou a identificar os setores carentes de investimentos, seja pelo estado, iniciativa privada ou pelo capital estrangeiro, e, dentro de cada um deles, um objetivo em casa meta.

Os objetivos foram constantemente verificados e revistos durante a aplicação do plano. Foram elaborados estudos das tendências de demanda e da oferta de cada setor e, assim, o plano recebeu um aprimoramento contínuo.

Mais de 40% dos recursos previstos para a implantação das metas de Juscelino Kubitschek estavam destinados para a importação de bens e serviços para garantir a incidência sobre a produção nacional. Houveram cooperativas, estabelecidos entre o setor público e privado, organizados em torno do BNDE.

Com essas medidas, a taxa de crescimento da economia ultrapassou as médias dos dois últimos quinquenios, 7% entre 1957 e 1962, contra apenas 5,2% nos períodos precedentes, sendo as taxas per capta de 3,9 e 2,1%. O produto industrial cresceu 11,3% ao ano, ainda que o setor agrícola tenha crescido apenas 5,8%.

O plano compreendia, então, um conjunto de 31 metas, organizadas nos seguintes setores:
·         Energia: 43,4% do recurso total previa investimentos em carvão mineral, energia elétrica, nuclear, produção e refinação de petróleo;
·         Transportes: 29,6% do recurso para pavimentação e construção de rodovias, serviços portuários e dragagens, reaparelhamento de ferrovias, marinha mercante e transporte aeroviário;
·         Alimentação: 3,2% do recurso, a fim de que fosse impulsionada a produção de trigo, construção de armazéns e silos, frigoríficos, matadouros industriais, mecanização da agricultura e fertilizantes;
·         Indústrias de Base: 20,4% do recurso para aplicação em siderurgia, alumínio, metais não-ferrosos, cimento, álcalis, celulose e papel, borracha, exportação de minério de ferro, indústria automobilística, construção naval, mecânica e material elétrico pesado;
·         Educação: 3,4% do recurso a fim de formar mão de obra técnica especializada.

É possível apontar que o Plano de Metas se traduz em um reflexo do pensamento político de JK, que idealizava o desenvolvimento, o progresso do país, expressado na frase “50 anos em cinco”. Entretanto, o ideal progressista passava por cima de princípios básicos, como a educação e a inserção no mercado da parcela da população que se mantinha alheia ao poder de consumo. Os bens produzidos pelas empresas que recebiam os incentivos eram alcançados por uma pequena parcela da população.

A maior parte desse desenvolvimento se concentrou no sudeste brasileiro, terra do presidente e onde estava o centro do poder no país, ou seja, a capital até então era o Rio de Janeiro. As demais regiões mantinham suas atividades econômicas tradicionais, fato que impulsionou uma grande migração, sobretudo do nordeste, para a região de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Tal fato chamou a atenção do presidente e então foi criada a Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). A proposta era que houvesse a industrialização e agricultura irrigada na região. Entretanto, o partido de JK era ligado aos coronéis do nordeste, que impediam a reforma agrária, condição necessária para superar as desigualdades sociais nos estados daquela região.

3.1. A Indústria de Bens Agrícolas

Dentro do Plano de Metas estava contido o Plano Nacional da Indústria de Tratores Agrícolas. Ele contribuiu decisivamente para a criação de unidades brasileiras e/ou nacionais de tratores e apoiou a expansão da indústria de auto-peças e componentes, elementos decisivos para o desenvolvimento da indústria de máquinas e implementos agrícolas. O decreto foi assinado em 22 de dezembro de 1959.

Tanto que, entre os anos 50 e 70, um grande número de novas empresas nacionais e estrangeiras se instalaram no Brasil. Entre empresas que montaram suas unidades em São Paulo está a Ford, responsável pela fabricação do primeiro trator produzido no Brasil. O modelo era movido a diesel e saía da fábrica com a parte frontal e o capô pintado em verde e o motor, eixos e chassi em amarelo, como forma de ressaltar a produção brasileira. Além da Ford, também se instalaram no Brasil a Valmet, Massey Ferguson, Fiat, Case e New Holland. Junto a elas, surgiram fábricas nascidas no próprio Brasil, mais precisamente no Rio Grande do Sul, como a SFIL, Francisco Stédile e Máquinas Ideal.

Até 1959, quando o decreto foi assinado, existiam no Brasil cerca de 150 modelos de tratores estrangeiros, de diversas marcas e diferentes tipos, o que obrigava os agricultores a fazer adaptações em implementos agrícolas. As fábricas desses componentes eram poucas, já que cada veículo tinha características muito diferentes dos outros. Outro fator que dificultava ainda mais eram as peças de reposição que precisavam ser importadas e levavam muito tempo para chegar ao país. Além disso, os revendedores não conseguiam montar estoques completos em função do grande número de componentes diferenciados. Tratores chegavam a passar quatro meses na espera pelo conserto, em meio aos períodos de safra, em que era necessário voltar a empregar tração animal na colheita.

Muito embora a indústria tenha sido fortemente impulsionada, a lacuna do analfabetismo no meio rural e a situação precária dos trabalhadores do campo não passaram por reformas e o quadro se mantinha crítico. Tanto que os investimentos em educação eram voltados para a área técnica, responsável pela criação de mão-de-obra especializada para operar máquinas. Nesse período, a população que deixava o campo no êxodo rural era habituada a uma agricultura extremamente primitiva e sem nenhum tipo de experiência com máquinas modernas. Os analfabetos chegavam a 40% da população brasileira.

3.2. A Indústria de Automóveis

As primeiras unidades de veículos fabricados no Brasil foram a Romi-Isetta, em 1956 e a DKW Vemaguete, uma caminhonete “station wagon”, no mesmo ano. Esses dois veículos disputam o título de carro mais antigo fabricado no país. Entretando, discute-se se a pequena Romi-Isetta seria, de fato, um automóvel. A DKW tinha linhas traseiras quadradas, que nada tinham a ver com a frente arredondada, herdada dos DKW fabricados na Alemanha, pela Auto-Union. Não havia muitas alternativas quanto à cor da pintura nem do estofamento. Mas a perua andava bem e surpreendia pelo desempenho e economia.

O motor era de dois tempos e três cilindros, com tração dianteira. Apenas 900 cm3 e 40CV. No entanto, sua aceleração e sua velocidade máxima eram razoavelmente boas para a época. O câmbio tinha quatro marchas para a frente e a estabilidade era satisfatória. O consumo de gasolina – que não era levado em conta naqueles tempos de fartura de petróleo – era surpreendentemente baixo. O grande inconveniente era a necessidade de se misturar o óleo à gasolina, no próprio tanque. Além disso, o cheiro exalado pela furgoneta  fosse simplesmente horrível.

Em 1958, a DKW colocou no mercado mais um produto de fabricação nacional, o Belcar, um sedan quatro portas. Os modelos dos primeiros anos tinham suas portas da frente que se abriam da parte frontal para o centro do veículo e acabaram apelidados de “deixa vê” por exporem damas que vestiam saias na hora de desembarcarem do automóvel. A mesma montadora ainda fabricou um jipe e o Fissore, outro sedan, de duas portas e desenho mais atual, com acabamento mais luxuoso. Algumas unidades dos DKW ostentavam logotipo dos quatro anéis unidos, semelhante ao dos Audi de hoje, criado após a fusão de quatro empresas na Europa, em que a própria DKW fazia parte.

Em 1959 a alemã Volkswagen começou a produção de automóveis em São Bernardo do Campo. O primeiro modelo a sair da fábrica foi a Kombi, em produção até hoje ainda com as mesmas características de quando foi lançada. Uma delas foi o uso do mesmo motor refrigerado a ar até meados dos anos 2000. Hoje ela é movida por um propulsor 1.4 totalflex, para atender as normas antipoluição. O modelo é o mais antigo em fabricação no país, mas já tem data para deixar a linha de montagem. A Volkswagen terá de parar a fabricação quando entrar em vigor a obrigatoriedade da instalação de Air Bags nos automóveis nacionais, já aprovada no congresso, pois a coluna de direção, praticamente na vertical, impossibilita a aplicação do equipamento.

Em seguida, a Volks iniciou ainda a fabricação do VW Sedan, ou seja, o Fusca. Uma criação realizada na Europa, em parceria com Ferdinand Porsche e que se tornou referência mundial de carro popular, com produção em várias partes do mundo. O último modelo foi fabricado até os anos 2000 no México. No Brasil, foi produzido até 1986 e voltou a sair da linha de montagem com um incentivo para carros populares, oferecido pelo presidente Itamar Franco em 1993. Saiu de linha em 1996.

GM e Ford também se movimentaram para aproveitarem os estímulos oferecidos pelo governo JK e passaram a fabricar componentes necessários para a construção dos veículos. Antes disso, todas as peças eram importadas e aqui apenas se fazia a montagem final dos automóveis. Entre os lançamentos da GM nessa época estão a Chevrolet Brasil, uma “station wagon” de grande porte, com altura elevada, e ainda uma picape do mesmo modelo. Os dois carros eram veículos utilitários. O primeiro sedan veio apenas em 1968, com a fabricação do Opala.

Willis e Simca também se instalaram no Brasil na mesma época e trouxeram modelos de sucesso na Europa. Os Simca, de origem francesa, eram belos sedans, com motores potentes, versões esportivas mas tiveram certa dificuldade de enfrentar as ruas e estradas sem pavimento da época e constantemente apresentaram problemas para seus proprietários. Já os Willis tinham mecânica mais confiável e sedan de grande porte “Aero-Willis” se tornou sonho de consumo. O Gordini foi objeto de desejo dos jovens da época e o Jeep conquistou uma legião de fãs pela capacidade de transpor qualquer tipo de terreno. As forças armadas mantinham frotas desses automóveis e muitos deles rodam até hoje.

A criação da indústria de automóveis se destacou e influenciou o orgulho dos brasileiros. A produção de carros era vista como um símbolo da riqueza nacional, muito embora tenha sido o mais equivocado dos projetos. As indústrias que chegaram no país estavam interessadas apenas nos incentivos oferecidos pelo governo e mantinham uma produção exclusivamente voltada para o mercado interno. A elas, não interessava tornar o Brasil um país de exportação de veículos, já que as matrizes americanas e européias já atendiam essa demanda.

O crescimento então era destorcido e só foi corrigido em parte no final dos anos 90, quando os produtos construídos no Brasil foram exportados para países do terceiro mundo por estarem adaptados a realidade de ruas e estradas deste tipo de economia. O Brasil encerra o milênio com a produção anual de quase um milhão de novos automóveis, sem que fossem feitos investimentos em ruas e estradas na mesma proporção e junto a isso, surgiram problemas de desemprego com o fechamento de fábricas e exigência de trabalhadores qualificados. 

No início, este cenário era imprevisível. A indústria automobilística do ABC paulista chegou a manter 140 mil empregados e incentivou a criação de fábricas de auto-peças, gerando progresso em cidades pobres como São Bernardo do Campo. Até então só a GM tinha um parque industrial completo. A Ford, como dito anteriormente, se resumia a um galpão para montagem, a partir de peças e componentes encaixotados, fabricados nos Estados Unidos.

São Bernardo do Campo deixou de ser uma cidade dormitório e teve seu centro deslocado para as margens da Via Anchieta, onde se concentraram as montadoras. Surgiu uma classe média, com moradores detentores de poder de consumo, geradores de impostos, o que permitiu a evolução da cidade em relação aos municípios vizinhos. A mão-de-obra especializada, por esse fator, torno-se politizada e o município foi o berço das reivindicações sindicais.

Esse progresso não saiu barato aos cofres do governo, já que a fabricação de peças dependia da expansão da indústria de base, mas que não interessava às grandes multinacionais. Com isso, a União teve de contrair empréstimos e aumentar a emissão de papel-moeda. Isso gerou inflação nos anos seguintes. O crescimento das cidades também gerou demanda por infra-estrutura, custeada pelo governo federal.

4. A Criação de Brasília

 


A criação de Brasília está ligada a uma profecia de São João Bosco, que anunciara sua construção no coração do país, a 15 graus de latitude sul. José Bonifácio já tinha intenções de levar a capital para o coração do país e o local do distrito federal passou a ser assinalado com um círculo nos mapas, sem que sua demarcação física fosse realizada. Um projeto de lei chegou a ser incluído na constituição federal, mas o desafio longínquo e romântico não inspirava os governantes.

Entretanto, o ideal desenvolvimentista de Juscelino Kubitschek tornou o projeto como prioridade do governo, a meta-síntese do Plano de Metas, em cumprimento ainda a uma promessa de campanha assumida em Jataí (GO). JK conseguiu ver sancionada a lei que concedia autorização ao congresso para que o executivo tomasse providências para a construção da nova capital. O presidente garantia que passaria o posto a seu sucessor já na nova capital. A primeira delas foi a criação da Novacap, Companhia Urbanizadora da Nova Capital, presidida por Israel Pinheiro.

Pinheiro estava na sua terceira legislatura como deputado federal e já havia apresentado uma emenda constitucional na qual delimitava a localização do Distrito Federal, em parte de Minas Gerais e Goiás. A proposta foi rejeitada, o que não o desencorajou de defender a ideia. Em 1956 foi convidado por JK para assumir a presidência da companhia e nomeado primeiro prefeito de Brasília, em 1960.

Três questões norteavam a criação de Brasília: o impacto de uma concepção de urbanismo aliado a uma arquitetura arrojada, originalidade e independência na captação de recursos, e urgência na construção de estradas. Este último ponto era considerado decisivo para que a nova capital não ficasse isolada no centro do país. Foram construídos 13,17 mil quilômetros de rodovias, de forma que a capital ficasse ligada a regiões dos quatro pontos cardeais. Destes, foram pavimentados 7,2 mil quilômetros, o que fez com que a malha asfaltada do país se expandisse 300%.

Esta foi a época dos grandes desbravadores da área central, entre eles, o engenheiro Bernardo Saião, que morreu em acidente de trabalho na Belém-Brasília. A multiplicação de rodovias acompanhou a evolução da indústria automobilística na época, em uma política voltada para a fixação de populações no interior do país. Desse modo, reduzia-se também o êxodo rural para a região sudeste.

No pensamento de JK, tratava-se de uma revolução de um novo tipo de integração nacional, através do desbravamento de regiões isoladas no interior, abandonadas desde a saga dos bandeirantes, de modo que se acabasse com a sonolência e o estado vegetativo dessas comunidades. Entretanto, a malha ferroviária existente no país caiu no desuso e no abandono, mesmo oferecendo um transporte de menor custo. Estradas de ferro, na época, representavam um símbolo do Brasil na era colonial e a proposta de JK, nesse sentido, era superar isso com asfalto e automóveis.

Na mesma linha, a nova capital deveria unir os dois lados do Brasil da época, um deles litorâneo, produtivo e moderno e o outro interiorano, estagnado socialmente e economicamente. Três mil operários foram atraídos para o centro do país na construção da nova capital. Eles eram conhecidos como “candangos”, trabalhando em jornadas sem fim até o dia da inauguração, em 21 de abril de 1960, quando a nova capital contou com a presença de mais de 100 mil visitantes.

Toda essa gente pode ver o nascimento de um símbolo arquitetônico idealizado por Oscar Niemeyer. Carioca do Rio de Janeiro, graduou-se pela Escola de Belas Artes em 1934. Foi o responsável pela maioria dos prédios de Brasília entre os quais o congresso nacional, o Palácio da Alvorada, de Justiça, do Planalto, dos Arcos, e a Catedral.

O traçado das ruas de Brasília obedece ao plano piloto, criado pelo arquiteto Lúcio Costa, é integrado por um sistema de ruas e avenidas largas cujos cruzamentos principais foram construídos em dois níveis. Junto ao plano piloto, surgiram as cidades-satélites para abrigar a demanda populacional do município. Hoje, são 2,6 milhões de habitantes em todo o conjunto, uma população heterogênea, oriunda de todas as partes do país, que até hoje mantém traços diferenciados entre si. Os brasilienses só começaram a surgir anos mais tarde, após a fixação das famílias no novo território.

Brasília foi erguida em três anos e dez meses, a partir de novembro de 1956, um tempo considerado recorde para a época. A construção do Palácio da Alvorada iniciou em 1956 e o plano piloto surgiu em 1957. Os engenheiros chegaram a planejar a construção da cidade em detalhes, como a cor e o modelo dos taxis (DKW cinza escuro), uniformes dos motoristas de ônibus e ainda quais vias deveriam ser mais ou menos iluminadas.

A pesar do final da construção ter se dado ainda no governo JK, os serviços só foram completamente transferidos para a capital no governo militar dos anos 70. Antes disso, até mesmo a construção de cidades satélites ficou paralisada.

5. As Dívidas

A pesar da gestão JK ter se dado em um período de mais calmaria política, ele não escapou das críticas, sobretudo após o início da pressão inflacionária e da estagnação no desenvolvimento. A oposição ganhou força sobretudo com a criação de Brasília, obra que consumiu boa parte dos recursos públicos e gerou uma série de desconfianças no destino das verbas, seja por superfaturamento ou pelo uso indevido. Entretanto, a governabilidade não chegou a ser abalada, pois o partido do presidente tinha maioria no parlamento.

O Plano de Metas foi apontado como algo generoso, segundo economistas, classificado como a mais sólida decisão consistente em prol da industrialização do país, de forma irreversível. Nessa época, foi possível fazer investimentos que alcançaram até 7,6% do PIB brasileiro. Entretanto, parte desses recursos foram obtidos em empréstimos de outros países e dos fundos internacionais de financiamento. Aí surgiu a dívida externa do Brasil, que consumiu boa parte da arrecadação ao longo dos anos 70, 80 e 90.

Como já foi apontado neste trabalho, a penetração de indústrias multinacionais foi maciça, através dos incentivos oferecidos pelo governo. Num primeiro momento isso foi positivo, mas logo se percebeu que o controle de setores importantes da produção estavam sob o comando de grupos estrangeiros. Entre os quais a produção de veículos, que levaram a falência a Fábrica Nacional de Motores e, anos mais tarde, a Gurgel, duas indústrias criadas por capital nacional. No setor de cigarros e eletricidade, o controle externo chegou a 90% e no de energia, 70%.

Com isso, os postos de comando e as decisões estavam fora do país, o que acarretou num desequilíbrio de pagamentos sobretudo nas remessas dos lucros dessas empresas para fora do país, em valores mais altos do que aqueles investidos na construção das intalações. Além disso, muitos brasileiros se viram obrigados a pagar royalties pelo uso de tecnologias patenteadas, muitas já ultrapassadas nos países de origem.

Entre as heranças menos desejadas do Plano de Metas está o surgimento da inflação, a partir da emissão destinada a cobrir investimentos governamentais, falta de contrapartida fiscal, falta de um esquema especial para a sustentação financeira. O governo chegou a lançar um programa de estabilização monetária, que deveria cobrir o período 1958-1959, mas este acabou sendo insuficiente pela estratégia da época: elevação espetacular dos meios de pagamentos e os pesados déficits orçamentários.

O Programa de Estabilização tentou frear os gastos públicos e o aumento da receita, mas foi ineficaz. O governo preferia o caminho da política desenvolvimentista, em detrimento das relações com instituições financeiras como o FMI, que pretendia disciplinar os investimentos nos programas como condição para recomendar financiamentos do exterior.

O Produto Interno Bruto do país cresceu 7% ao ano e a taxa de renda per capta aumentou quatro vezes mais que os países da América Latina. Entretanto, as exportações não atingiram o mesmo valor do endividamento externo, principalmente pela política adotada pelas indústrias que vieram para cá, a fim de voltar a produção apenas para o mercado interno. Com isso, o presidente acabou em meio à montanhas de juros cobrados pelo capital externo, o mesmo que lhe havia proporcionado o desenvolvimento. A taxa de inflação ficou cada vez maior e a moeda brasileira, o Cruzeiro, estava cada vez mais desvalorizada no mercado mundial.

A sorte de Juscelino Kubitschek foi que esses problemas só vieram a tona ao final de seu mandato, o que lhe garantiu a imagem de político visionário, responsável pelo desenvolvimento do país. Nesse sentido, é possível apontar que o Brasil colocou a “carroça na frente dos cavalos”, ao buscar um desenvolvimento industrial, antes de garantir educação e solidificar as estruturas existentes. Entre elas, a educação dos brasileiros. O analfabetismo alcançava quase metade da população da época e o acesso a cursos universitários só era possível a uma parcela pequena da população.

Além disso, o Plano de Metas precisaria conter um fomento maior às iniciativas de produção tomadas pelos próprios brasileiros, com indústrias nacionais, de origem nacional. Ao priorizar incentivos para o capital estrangeiro, favoreceu-se o domínio e o monopólio de grandes multinacionais sobre o consumo da população. Como resultado disso, as riquezas acumuladas acabaram voltando aos países de origem das empresas.

Por fim, é possível concluir que Juscelino estava correto ao apontar que o Brasil precisaria ser industrializado, mas não a qualquer custo, consumindo uma quantidade exacerbada de recursos. Dinheiro esse que o Brasil não possuía e gerou dívidas impagáveis ao longo das décadas seguintes. Além disso, o Plano de Industrialização também se revelou insustentável, já que por mais que a produção aumentasse, o acúmulo de capital gerado ia para fora do país.

6. A Morte de Juscelino


Juscelino Kubitschek deixou o poder em 31 de janeiro de 1961, já candidato a um novo mandado no palácio do Planalto. Desta vez, o enfoque seria a agricultura. Para isso, um novo plano de metas seria elaborado, voltado para o setor primário.  João Goulart ocupava o poder em 1964, após a renúncia de Jânio Quadros e, naquele ano, a convenção do PSD homologou JK como candidato a presidência por 2848 votos.

Nessa época, empresários brasileiros estavam descontentes com o governo de Jango, assim como as Forças Armadas. Os setores conspiravam contra o presidente, até o golpe de estado deflagrado no dia 31 de março daquele ano. No primeiro Ato Institucional, as eleições para presidente foram suspensas e os direitos políticos poderiam ser suspensos pelo prazo de dez anos.

Nesse momento, era fato consumado que o novo presidente seria um militar. JK então resolve apoiar a candidatura do general cearense Humberto de Alencar Castelo Branco, que comprometeu-se em manter o calendário eleitoral de 1965 e dar posse ao eleito. Eleito, Castelo Branco não conseguiu manter o controle das Forças Armadas e acabou tendo como ministro da Guerra o General Costa e Silva.

Este recomendou a Juscelino que desistisse da candidatura, mas JK não aceitou e o presidente militar acabou caçando o mandato de senador do ex-presidente, sob influência do ministro. Na tribuna, antes de ser caçado, Kubitschek fez um discurso apontando que as injustiças e a crueldade cresceriam, mas o castigo viria algum dia. Após ser caçado apontou que a tirania se arrastaria por anos e levaria, inclusive, seus desafetos.

Com direitos caçados, JK refugiou-se na Espanha, após alguns dias no prédio da embaixada daquele país, no Rio de Janeiro. Esteve também em Paris, Lisboa e Nova Iorque. Se dizia castigado e com receio de morrer longe do Brasil. Esteve no país para prestar longos depoimentos e ainda para o velório da morte de sua irmã. Teve anistia em 1967, quando retornou.

Precisou ingressar na sociedade de um banco de investimentos para poder garantir o sustento e obteve bons negócios até a separação da filha Márcia, fato que o obrigou a deixar a sociedade. Passou a atuar na Revista Manchete, como escritor de artigos e resenhas. Com a instalação do AI-5, JK foi preso na saída de uma formatura, em que era paraninfo. Ficou dias em uma cela isolada e depois, em prisão domiciliar. Foi proibido de ir a Brasília, mas, em um dia de temporal, acabou entrando na cidade dentro de um caminhão Ford, de onde contemplou prédios que ainda não estavam terminados quando foi levado ao exílio.

Em 1972, comprou uma fazenda62 quilômetros da capital nacional e construiu uma casa projetada por Oscar Niemeyer e uma capela, nos moldes da que existia no palácio da alvorada. O dinheiro para isso veio de um empréstimo. Plantou soja, milho e café, mas deste último, não viu a primeira colheita. Tentou cadeira na academia brasileira de letras, mas por pressão dos militares, acabou derrotado.

Em 9 de agosto de 1976, surgiu na imprensa a notícia de que JK havia morrido em um acidente de automóvel na estrada. Entretanto, o ex-presidente foi localizado na fazenda. Disse que aqueles que o queriam matar ainda não haviam conseguido. Entretanto, a situação foi diferente no dia 22 daquele mesmo mês.

No Chevrolet Opala quatro portas, ano 1970, estavam JK e o motorista Geraldo Ribeiro, quem conduzia o ex-presidente desde que era prefeito de Belo Horizonte, em 1940. A versão dada na época relata que, no quilômetro 165 da Via Dutra, um ônibus atingiu o Opala por trás. O veículo perdeu o controle, atravessou o canteiro central e bateu de frente em uma carreta. O Chevrolet ficou completamente destruído.

Chegou-se a cogitar que a morte de Juscelino Kubitschek fora um atentado. Ele seria mais um da lista na suposta Operação Condor, um movimento das ditaduras sulamericanas para eliminar lideranças políticas influentes, numa época em que a democracia estaria retornando aos países.

O corpo de JK foi levado para o Instituto Médico Legal do Rio de Janeiro e depois para Brasília, onde milhares de pessoas se uniram ao cortejo. O sepultamento só ocorreu às 23h35 do dia 23 de agosto de 1976. Em setembro de 1981 os restos mortais foram levados para o Memorial JK, projetado por Niemeyer. Anos mais tarde surgiu ainda o boato de que a esposa de Juscelino teria recebido a visita de um homem que se apresentou como o motorista causador do acidente. Ele teria dirigido um outro automóvel – e não um ônibus – e teria recebido ordens para investir contra o Opala, desgoverná-lo e provocar o acidente. Sarah Kubitschek teria o perdoado.